terça-feira, 26 de março de 2013

ASSUNÇÃO (PARTE 01)




Sou cristã.
Sou aprendiz das lições do Cristo.
Amo Jesus com todas as forças do meu coração, mesmo que tudo o que eu consiga vivenciar de seus ensinamentos seja apenas uma pequena parte, ínfima parte...
Já li as cartas de Paulo, inclusive as polêmicas cartas aos romanos e procurei saber das traduções menos afetadas, mais fiés ao vernáculo em que foram escritas. Foi preciso conhecer o pensamento do povo hebreu e dos gregos para concluir que um documento tão sublime não poderia embasar o assassinato da filósofa Hepatia, a desvalorização e submissão da mulher, o ódio aos homossexuais, aos cabeludos e nem a estigmatização de nenhum ser humano. De nenhum ser humano.
Mesmo assim, fico espantada com as interpretações que dão ao que é realmente sagrado (a essência e não o papel), com as manipulações, com todo o desvirtuamento que pretende tornar o amor algo menor, mesquinho e impuro.
As coisas que fazem em nome de Deus, de Jesus, de Paulo ou de qualquer um que serviu a humanidade em nome do Amor, não possuem ligação alguma com a caridade benfazeja, com o Bem, com o Belo, com o não julgar, com o oferecer a outra face, com o perdoar e com o servir.
As Cruzadas, a Inquisição, a negação da ciência, o preconceito, o vilipêndio, os julgamentos sumários, as condenações sumárias e outras diversas formas de ignorância, são atitudes que distanciam o homem de Deus ao invés de reconduzi-lo. É assim que geramos um deus à NOSSA imagem e semelhança e o deixamos agonizar em nossas mãos, morto lentamente pela corrosão de uma fé arbitrária e delirante.
A Religião não seria necessária se fôssemos perfeitos. Ela serve apenas de muleta para quem não consegue ainda caminhar sozinho, ser dono do próprio destino e ter autonomia para fazer escolhas sem afetar negativamente a vida do seu próximo.
Madre Tereza entendeu isso quando se livrou de qualquer rótulo religioso e percebeu que sua maior religião era seu próximo. Era o outro.
Nós outros mal exergamos o outro. Nós outros somos mancos e carecemos dessas muletas.
De qualquer forma, a religião fez mais bem ao mundo do que o materialismo e é por isso mesmo que não consigo entender... Não entendo em qual parte do caminho nós nos aprisionamos, nós nos escravizamos assim. 
A religião deveria nos libertar, deveria nos oferecer ampla vista, deveria nos estimular a melhorar o mundo, a melhorar a nós mesmos, acabar com as guerras e os protocolos, os cárceres do mundo e os cárceres íntimos. Deveria fazer o filho confiar nos pais e vice-versa, deveria nos unir, mostrar que somos todos da mesma família universal e que por isso mesmo deveríamos nos amar, procurar nos entender e estender a mão para aquele que ainda não consegue caminhar sozinho, para aquele que ainda enfrenta inúmeras dificuldades. Estender a mão como já fizeram conosco tantas, tantas vezes.
A Religião deveria nos mostrar que a Ciência é uma expressão divina que nos conduz ao progresso, por mais que as perguntas se multipliquem a cada resposta encontrada. A religião deveria tornar evidente toda a ciência contida nos ensinamentos evangélicos, explicando com racionalidade os aparentes absurdos e assumindo os erros propositais cometidos por homens comuns e não negar o que é difícil de entender.
A função da religião deveria ser (e é!) nos religar a algo maior, a Deus, Alah, Força que Rege o Universo, Inteligência Suprema, Elohim, Causa Primária de Todas as Coisas, Jeová ou qualquer outra denominação que nos remeta ao Amor.
Então porque as pessoas (tão religiosas!) querem privatizar a verdade e o amor e após privatizar, tributar  aquele que ousa sentir? Por que privilegiar um povo, tachar quem não foi eleito, emburrecer as massas, separar os diferentes e deletá-los do caminho da redenção? Por que distanciar do nosso irmão que o sangue nos ofereceu quando ele pensa diferente de nós? Por que tanto escarcéu e guerra se nem o próprio Jesus lançou qualquer olhar de reprovação a Pedro em suas mancadas, a Judas em seu engano ou à turba (burra) que o crucificou? 
Por que tantos insistem em enxergar o próximo como inimigo, como anomalia e não como irmão?
(...)
Pecar significa errar o alvo.
Pelo que vejo, muitos do povo de Deus estão acertando a borda.
Ou o ar ao redor...

*
*

PODRES PODERES
Caetano Veloso

 Enquanto os homens exercem
 Seus podres poderes
 Motos e fuscas avançam
 Os sinais vermelhos
 E perdem os verdes
 Somos uns boçais...

 Queria querer gritar
 Setecentas mil vezes
 Como são lindos
 Como são lindos os burgueses
 E os japoneses
 Mas tudo é muito mais...

 Será que nunca faremo senão confirmar
 A incompetência da América católica
 Que sempre precisará de ridículos tiranos
 Será, será, que será?
 Que será, que será?
 Será que esta minha estúpida retórica
 Terá que soar
 Terá que se ouvir
 Por mais zil anos...

 Enquanto os homens exercem
 Seus podres poderes
 Índios e padres e bichas
 Negros e mulheres
 E adolescentes
 Fazem o carnaval...

 Queria querer cantar
 Afinado com eles
 Silenciar em respeito
 Ao seu transe num êxtase
 Ser indecente
 Mas tudo é muito mau...

 Ou então cada paisano
 E cada capataz
 Com sua burrice fará
 Jorrar sangue demais
 Nos pantanais, nas cidades
 Caatingas e nos gerais
 Será que apenas
 Os hermetismos pascoais
 E os tons, os mil tons
 Seus sons e seus dons geniais
 Nos salvam, nos salvarão
 Dessas trevas e nada mais...

 Enquanto os homens exercem
 Seus podres poderes
 Morrer e matar de fome
 De raiva e de sede
 São tantas vezes
 Gestos naturais...

 Eu quero aproximar
 O meu cantar vagabundo
 Daqueles que velam
 Pela alegria do mundo
 Indo e mais fundo
 Tins e bens e tais...
 

6 comentários:

Anônimo disse...

Michele, amiga muuuuito querida. Adorei essa sua postagem. Parabéns! Gostei disso:
" Porque tantos insistem em enxergar o próximo como inimigo, como anomalia e não como irmão? "
Taí a proposta para o caminho de vida para 2013. É só aplicarmos.
Um beijo carinhoso no seu coração.
Manoel

Alvaro Vianna disse...

Ora! Nosso assunto predileto. Então não precisarei me estender muito pra dizer que não acho necessária a religião e nem qualquer Deus para se fazer coisas boas, né? Ainda assim, acho que o seu modo de crer é melhor que o da maioria. Se eu cresse, seria assim também.
Pensei que em algum momento você falaria do pastor Feliciano e do PSC, que tomaram de assalto os direitos humanos no Brasil. Acho que seu texto poderia muito bem servir de apoio nos vários protestos contra essa outra turba burra que conseguiu se imiscuir numa instituição, que de tão humnana, só poderia admitir algo religioso dentra dela se fosse nesses bons moldes que você delineia tão bem, aqui.

Beijo

Unknown disse...

Você é foda, irmã! Pode compartilhar no face? Seu texto? Com sua autoria?

sblogonoff café disse...

Pois é, Manô, a faixa fundamentalista é muito maior do que a de Gaza...
De qualquer forma, aplicar humanidade em nossos atos já está de bom tamanho, né?
Beijooo!

Pensei em você quando escrevia. No exemplo de dignidade e respeito que você é sem acreditar em Deus.
Em verdade, em verdade vos digo que os pastores me inspiraram mesmo. O bom é que eles estão levando as pessoas a discutirem uma questão que ficou por tanto tempo fazendo o papel de elefante branco ou de piada de programa de humor!
Eu podia vir aqui e sentar a pua em Renan Calheiros, José Dirceu, na médica monstra... Mas eles não deviam representar algo maior. Mas acho triste e até irritante ver que a ignorância das massas possa nos afetar de um modo político, na organização das leis e do estado. A meu ver, parece um retrocesso...

Janas, se prepara!!! Estou no seriado Assunção!!! Entre outras coisas!!Rsrsrs!!
Com uma equipe a gente enfrenta tudo!!!!

Mulher Vã disse...

Excelente abordagem!

Houve um tempo em que acreditei com todas as forças que religião era a tábua de salvação para todo o mundo e seus pecados, que a bíblia fosse o livro dos livros com a mais pura verdade universal incontestável, em que ao mesmo tempo considerava-me uma causa perdida para os moldes cristãos, achava Deus um fodão poderoso que nunca me aceitaria no seu clubinho que compoe Seu mais alto escalão de criaturas perfeitas. E isso minava qualquer fé que eu pudesse conceber...
Por algum tempo, pertencer a uma X religião tornou-se algo mais imposto que escolhido, juro que quis muito me encaixar aos padrões que todos esperavam, mas não foi possível, eu tentei com toda a sinceridade que pude. Mas não rolou.
Depois disso, ficou um pouco de ressentimento contra Deus, contra a vida, é que os valores se confundem e a moeda sofre inflação o tempo todo. Com o tempo percebi que estava me tornando uma cínica cheia de recalque.
Vaguei por aí sem rumo.
E no dia que finalmente fez sentido pra mim, a inexistência da soberania biblica sobre os outros livros, meu mundo caiu, talvez pra quem estaja lendo isso não faça muito sentido, mas é a pura verdade.
Aos poucos entendi que ninguém é portador da verdade, aquela que todas as religiões afirmam possuir e que fundamentalismo é a coisa mais burra já existente no mundo. Sobre você dizer que ela é necessária, Desconcordo, em parte! Porque não existe coisa mais segregadora que religião. Mais um instrumento de opressão e submissão que de amor.
Bater na porta de alguém e querer enfiar goela abaixo das outras pessoas a sua verdade, é no mínimo sintoma de transtorno mental, sem contar a forma como algumas seitas por aí tratam seus ex membros...
Mas também o governo não colabora,qualquer ex presidiário, ex gay, ex bbb que quiser pode abrir uma! É facinho, pelo que sei o gasto, não chega nem a R$ 500,00, e aí só desfrutar da isenção de impostos sobre patrimônio, renda e serviços. Essa isenção tributária é constitucional e se insere no espírito de que todos tem a liberdade de crença e coisa alguma, como a cobrança de impostos, por exemplo, poderá cerceá-la. Tudo bem ser isento de imposto se pelo menos transformassem a sociedade melhor de se viver.
Só que com a religião outra coisa vem junto: hipocrisia.
Quem não é assim, acho que só resta sentir pena...
Tô contigo, Marx!

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Anônimo disse...

Você sempre foi muito maior do que a idéia que tinha sobre religião.

Por isso se sentia apertada.

Não se pode colocar a China no Japão!!!

S.P!!

Michele